Aquele bar


Não chovia. O sol desaparecia no céu, embora desperto, embora fosse Inverno.
Cheguei, e tu já lá estavas. Como sempre. Sentado num banco de madeira escura, ao fundo das escadas, virado para o mar. Como sempre. Embora com as costas de frente para mim, viste-me chegar.

Eu, imóvel ao cimo da escadaria, contemplava o horizonte encoberto, onde ansiava estar, para me perder, para me soltar em toda a existência daquela paisagem que me era oferecida por uma natureza tornada viva, com o embater da água nas rochas, pintando o céu. Vi-te. A tua boca abriu-se num sorriso e a tua mão tacteou insistentemente no banco escuro em que te sentavas, como um convite a descer. Sorri, em resposta.

Desci. Estava já perto de ti. Conversámos o que nunca imaginámos. Muito ficou por dizer.

Olhámos à direita e o dia caía suavemente, contrariado. Do lado esquerdo, o céu permanecia azul. Escuro. Passaram pássaros, voando sobre nós, perdidos em bandos, sós. Eu não conseguia distinguir umas das outras. Mas tu conseguias. Como sempre. Ensinaste-me os seus nomes e como voavam. Soube, finalmente, diferenciá-las e o meu olhar perdeu-se nessa magia de pairar sobre os corpos terrenos, sob os espíritos supremos.

Contei-te sobre os meus anseios, as minhas vontades e as minhas mais profundas ambições. Senti-me serena.

Enquanto o dia se desmanchava, formava-se sobre nós uma tela imaculada e singular, onde o sol tornava o céu ocre e as nuvens o transformavam em dia e, simultaneamente, noite. Tudo se fortalecia em mim. Tudo em sonho. Tudo é afecto. Tudo é paixão. Tudo é segredo. Tudo em segredo.

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